Do Jornal do Commercio
“Tudo acaba mas o que te escrevo continua.” O trecho do
último capítulo do livro Água Viva, de Clarice Lispector, está gravado em uma
placa afixada ao sobrado de número 387 da Praça Maciel Pinheiro, na Boa Vista,
Centro do Recife. Foi na graciosa casa rosada de janelas amplas que Clarice
viveu parte de sua infância na capital pernambucana. E, se os primorosos
contos, romances e ensaios deixados por ela permanecem inalterados com o passar
do tempo, o mesmo não se pode dizer do espaço que, por anos, abrigou uma das
escritoras mais importantes do século 20. Assim como a pintura desbotada, as
memórias de Clarice na antiga casa vão se apagando. O que resta são os pedaços
do que um dia foi.
Desocupada desde 2010, quando se começou a cogitar a criação
de um memorial em homenagem às irmãs Lispector, a casa já foi alvo de várias
ações de depredação. As paredes do imóvel, de propriedade da Santa Casa de
Misericórdia, ostentam pichações. Portas e janelas foram arrancadas por
vândalos. A escada que levava ao sótão, mencionado em algumas obras de Clarice,
também foi destruída. “Tivemos que lacrar as portas porque a casa era
constantemente invadida e depredada”, explica Rilane Dueire, superintendente jurídica
da Santa Casa.
A proposta de transformar a casa em memorial e espaço cultural
partiu da sobrinha neta de Clarice, a cineasta Nicole Algranti, mas esbarrou na
falta de recursos. Com o projeto orçado em cerca de R$ 2 milhões, e sem nenhum
financiador, a cineasta desistiu da iniciativa.
De acordo com a Santa Casa, até o final de junho será concluída a
elaboração do projeto arquitetônico de restauro do imóvel. O próximo passo é
conseguir verba junto à Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco
para custear a restauração da casa, considerada um bem cultural. Já o memorial
ainda está distante de se tornar uma realidade. “O nosso sonho era dar esse
presente ao Recife. É inadmissível que a memória de uma escritora tão grandiosa
como Clarice se acabe desse jeito”, afirma Rilane Dueire.
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